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sábado, 9 de junho de 2012

Ravi e o santo de barro

Os ídolos são apenas obras das mãos dos homens

Por Marcelo Crivella/Fotos: Thinkstock
redacao@arcauniversal.com

Em uma cidade do Estado de Minas Gerais, há muitos e muitos anos, havia um povo crédulo, bondoso e extremamente religioso.

A mais linda casa daquela tranquilíssima localidade pertencia ao coronel Itamar Vieira, e era a sede do Sítio São Ciprião, de sua propriedade, outrora Sítio Pedra Amarela, por possuir uma enorme formação rochosa dessa cor, da qual descia uma bela cachoeira.

O sítio mudou de nome depois que a senhora do sítio, D. Carlota Vieira, viúva do avô do coronel, enquanto rezava no bosque, teve uma visão de um suposto santo, o qual durante muitas noites voltou a visitar a piedosa senhora, sempre naquele mesmo local.

A viúva contou a visão ao padre e, descrevendo a aparência do vulto, deixou no vigário a plena certeza de que se tratava do "santo" Ciprião. A cidade, maravilhada, adotou-o como padroeiro milagroso.

A viúva envelheceu e veio a falecer. Muito querida por todos, foi canonizada: virou "santa vovó Carlota Vieira". O leitor não esqueça de que aquela aprazível cidadezinha era muito religiosa. O padre representava a mais alta autoridade para aquele povo simples e católico.

O coronel, sendo neto daquela "santa" senhora, era muito respeitado por todos. Já tinha sido de tudo na comunidade: delegado; diretor do grupo escolar; juiz de Direito; mantenedor da Santa Casa e prefeito por três vezes. Era o maior vulto do lugarejo. Tinha a fama de nunca ter faltado com a palavra e estado sempre presente às missas de domingo. O homem tinha lá os seus defeitos, mas todos concordavam; palavra boa era a palavra do coronel.

A vida seguia calmamente, até que, numa noite chuvosa, chegou à entrada daquela cidade um vulto estranho. Era Ravi, um larápio de segunda classe, que vivia de enganar incautos. Vendo alguns andarilhos, que se abrigavam da chuva debaixo de uma frondosa árvore, juntou-se a eles, perguntando que cidade era aquela. Os homens, com toda a sua admiração pelo local, contaram-lhe toda a história da cidade, do coronel e da santa viúva com sua visão. Foi como se uma luz se acendesse na mente maldosa de Ravi. Certamente aquele povo crédulo e piedoso era um prato cheio para o estelionatário.

Deixando para trás os andarilhos, dirigiu-se, sob a chuva intensa daquela noite fria, para a casa do coronel. Lá chegando, encontrou próximo à casa o bosque, a cachoeira e a tal pedra amarela. Subiu na árvore mais alta e começou a assobiar o mais alto possível.

Intrigado com o ruído, o coronel mandou que os seus empregados fossem verificar do que se tratava. Ravi então desceu da árvore, cobriu o corpo com terra molhada e pôs-se a rezar, como se fosse um santo. Na escuridão da noite, os empregados do coronel, ao verem aquele vulto, correram para avisá-lo de que "São Ciprião" havia voltado.

O homem disparou para o local e, quando viu aquela cena armada por Ravi, chegou a cair no chão. Mandou que levassem imediatamente o "santo" para o melhor quarto da casa, dando-lhe a melhor comida. Enquanto isso, o coronel colocava em um baú, à disposição do "padroeiro", todas as suas riquezas.

Na manhã seguinte, a notícia de que "São Ciprião" havia voltado correu por toda a cidade. Um a um, os moradores daquela localidade foram ao sítio, na ânsia de encontrarem o "santo". Todos levavam os mais belos presentes e os juntavam às riquezas do coronel dentro daquele baú, que o leitor não deve esquecer. Queriam ver algum milagre do padroeiro da cidade.

O coronel, emocionado, em nome de todos subiu ao quarto, onde se encontrava o homem, com as janelas e as portas fechadas, e, de joelhos, disse:

- "São Ciprião", venho, em nome de toda a cidade, pedir que faças um milagre, de tal forma que todos venham a se maravilhar.

- Meu filho, mostrar-lhe-ei dois milagres. Tu, porém, deves me dar a tua palavra de que não me tomarás nada do que me deste, e a ninguém revelarás o segredo do santo disse o astuto Ravi, com voz mansa e pausada, de modo a convencer ainda mais o coronel da sua suposta santidade.

- Tudo que disseres, farei, ó santo. Tens a minha palavra, a qual jamais deixei de cumprir em toda a minha vida. Afirmo que nunca revelarei o vosso segredo respondeu o coronel ao astuto Ravi.

- O primeiro milagre que fiz foi, com a terra molhada pela chuva, transformar um ladrão inescrupuloso em um virtuoso santo, pois que não passo de um larápio a roubar e enganar. O segundo milagre foi que revelando a ti minha identidade, torno novamente o santo em ladrão - revelou o estelionatário.

O coronel se encheu de fúria. Sentiu-se enganado e humilhado; nada, porém, pôde fazer diante da esperteza do ladrão, visto que nunca poderia descumprir uma palavra dada.

Assim, Ravi, naquela mesma noite, desapareceu pela estrada, levando as riquezas daquela cidade. Antes de partir, porém, revelou aos andarilhos, que encontrou pelo caminho, que seu nome lhe fora dado por seu avô, o qual contava com o respeito de uma rica viúva, que conhecera em um bosque, onde havia uma rocha amarela e uma cachoeira, e de quem foi amante secreto por muitas noites, recebendo muitos presentes.

O nome Ravi era a junção das letras "r" e "a", tiradas do primeiro nome da linda senhora, e também "v" e "i" , tiradas do seu sobrenome. O nome dela, sem tais letras, revelava quem ela realmente era, pois Carlota sem o "r" e o "a" fica "Calot", e Vieira sem o "v"e o "i" fica "eira". Juntando as duas palavras, tem-se "caloteira"!

Lá se foi pela estrada o larápio com o baú, rindo-se muito das histórias da "Santa Carlota Vieira", ou melhor, "Vovó Caloteira"!

Que tristeza sentimos ao vermos multidões de pessoas apegadas a tantas lendas e histórias, quando a Bíblia ensina que há só um Deus, e para se chegar a Ele há um só caminho: Jesus. Os ídolos são apenas obras das mãos dos homens, cujo único "milagre", se assim podemos dizer, é enganar os incautos.

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